Por que os iranianos não engolem “Argo”?

Esse cartaz ilustra bem a ótica ocidental sobre o Irã,  não?
Salam amigos, a premiação do Oscar de melhor filme do ano para Argo ontem à noite, merece ou não  um comentário? Confesso que assisti à cerimônia aguardando que o premiado fosse Os Miseráveis, aliás um filme incrivelmente bem produzido e emocionante, saindo um pouco do meu vício pelo cinema estrangeiro… Mas o momento de anúncio do maior prêmio da noite não poderia ser mais espalhafatoso e teatral: direto da Casa Branca, anunciado por ninguém mais do que a primeira dama dos EUA, Michele Obama! 
Em seu discurso de agradecimento, o visivelmente eufórico, Ben Affleck, deixou escapar umas pérolas tipo “aos meus amigos do Irã que estão vivendo uma situação terrível agora…”, e “agradeço à minha querida esposa, embora não costume associá-la ao Irã numa mesma frase…”
Por isso, achei  interessante traduzir aqui um trecho do artigo do jornalista Saeed Kamali Dehghan, que escreve para o site britânico The Guardian. Nele o jornalista iraniano, descreve sua experiência ao assistir o filme e faz um comentário bem razoável sobre o mal estar gerado pelos acontecimentos que deram origem ao filme:
…Quando eu fui assistir Argo de Ben Affleck, semana passada eu sabia de antemão que ia ser uma experiência bastante dolorosa.(…) “É um filme, não um documentário,” tentei me lembrar. Mas a alegação de que foi “baseado em uma história real” criou grandes expectativas em mim (…) e algumas coisas me chamaram a atenção:
Primeiro, foi a tentativa desesperada de Affleck para fazer um filme ambientado no Irã sem ter sido capaz de ir pessoalmente para dentro das fronteiras [do país]. Tendo escolhido em vez disso filmar na Turquia, Affleck fez o seu melhor – bem, o melhor possível ao fazer um filme sobre o Irã, filmado em um país vizinho.



Para ser honesto, os locais não são muito ruins. Os edifícios são semelhantes aos do Irã, as casas não são tão diferentes, o bazar é bastante parecido com o real centro comercial no sul de Teerã. Banners, cartazes e sinais estão em persa e muitos personagens, na verdade, falam a língua, embora com algum sotaque.



No entanto, há alguns erros bobos, em uma cena, por exemplo, o protagonista Tony Mendez (Affleck) diz “salam” no final de sua conversa com uma autoridade iraniana. “Salam” significa “Olá” em persa não, “adeus”.



Erros menores à parte, o filme é uma visão em preto e branco dos iranianos, como em muitos outros filmes ocidentais sobre o Irã. Eles são retratado como feios, pobres, estritamente religiosos, fanáticos e ignorantes – tal como parecem os jovens revolucionários por trás da tomada de reféns na embaixada dos EUA em Teerã após a revolução islâmica de 1979, do qual o filme fala. A única iraniana boa no filme é a empregada do embaixador canadense.



Essa empreitada é o mesmo que pedir a um iraniano que nunca foi aos EUA para fazer um filme sobre o massacre na escola de Columbine. Você provavelmente vai acabar assistindo a um filme em que todos os americanos são loucos, têm uma arma em casa e estão prontos para atirar em seus colegas de classe.



Quando estava saindo do cinema com meu amigo iraniano (e presumo que fomos os únicos iranianos na sala), fomos cautelosos para não falar em persa muito alto para sermos notados. “Oh meu Deus, eles são iranianos”, outros dizem, como se fôssemos de Marte.



Mas o que me preocupa mais é como o filme me lembra da história do Irã, de como um grupo de meus compatriotas traíram o Irã, tomando um grupo de pessoas como reféns e trazendo dor e trauma para outro país por 444 dias. Por anos na escola me ensinaram que a tomada de reféns de diplomatas americanos foi um ato de resistência, heroísmo em nome dos revolucionários mostrando sua ira contra a interferência dos EUA nos assuntos internos iranianos.



Argo, de repente apaga toda a retórica revolucionária e me lembra o outro lado da história. Ele mostra as faixas amarelas nas ruas de Washington DC, a angústia e a dor causados ​​pelo incidente, e isso me faz lamentar o que aconteceu há mais de 30 anos atrás. O filme de Affleck pode representar um Irã que eu quase não reconheço, mas é um lembrete amargo de como jovens revolucionários e seus líderes colocaram o Irã em uma crise que teve consequências para o seu povo a partir deste dia (…)


Baseado em  The Guardian

Meu comentário: Achei o filme dublado online em boa qualidade para quem quiser ver, clique aqui
Sinceramente, assisti às 2 horas de filme com cara de paisagem, procurando algo que pudesse me surpreender e ao menos achar uma razão para ele ter merecido o Oscar de melhor filme do Ano. O filme deixa de lado o drama histórico dos cerca de 60 funcionários reféns na embaixada americana em Teerã e se concentra apenas na fuga do grupo das 6 pessoas salvas pelo heroico mocinho da CIA (pra variar). Ele até consegue cumprir o objetivo de reproduzir bem as localidades e o visual dos anos 70 com uma boa fotografia, e nos fazer torcer  até o fim pela turma de americanos inocentes que tenta escapar das garras dos iranianos barbudos e “maus”. Ah, o ator que faz o funcionário do consulado é o Rafi Pitts, um conhecido ator e diretor do cinema iraniano (amigo do Affleck, será?!)… Mas o resto achei  puro clichê e não acrescenta nada a longa lista de filmes estilo Bad Arab já feitos por Hollywood, retomando alguns dos mesmos arquétipos da série O Vôo da Águia, feita nos anos 80.  E o Oscar de melhor frase dita no filme vai para: “Argo vá se ferrar!” Essa é a minha opinião, tá gente, quem gostou do filme fique a vontade para discordar. 

Este post tem 0 comentários

  1. Star Kaur

    Salam!!
    Eu não sou boa no assunto mas gostei do filme e não achei nada ofensivo ao Irã como dizem alguns críticos, e pra falar a verdade achei bem água com açúcar, pegaram leve, principalmente por se tratar de um filme americano que relata a deposição de Reza Pahlavi. Gostei, prende a atenção do início ao fim.

    Um parágrafo que me chamou a atenção: "Quando estava saindo do cinema com meu amigo iraniano (e presumo que fomos os únicos iranianos na sala), fomos cautelosos para não falar em persa muito alto para sermos notados. "Oh meu Deus, eles são iranianos", outros dizem, como se fôssemos de Marte."
    Juro que me senti assim quando saí do cinema com meu marido. Naquele mesmo dia uns americanos foram assistir o filme. Com a cara de iraniano que o meu marido tem e ainda não fala português já viu o clima tenso na sala do cinema! Mas graças a Deus aqui no Brasil essas desavenças não são escancaradas.

    Beijos!

  2. Janaina Elias

    Salam Star!
    Eu procurei o filme para assistir online só por curiosidade mesmo. É verdade o que vc diz, o filme é bem caldo ralo comparado com outros já feitos sobre Oriente Médio. Não chega a ser ofensivo, mas os iranianos são retratados como estereótipo de barbudos de olhar furioso, assim como as mulheres nervosas de chador… e não me surpreende o mocinho americano mais uma vez salvar o mundo.
    Bem curioso que tenha acontecido algo semelhante com o seu marido no cinema. Aliás tem muitos iranianos e indianos que se parecem mesmo, não dá pra distinguir fácil… Também não acho que os povo americano odeie os iranianos, porque há uma imensa comunidade vivendo muito bem nos EUA, o problema é a política mesmo…
    Beijão!!

  3. Anônimo

    Salam, Jana Jan!

    Saudades de ti…Concordo com sua opinião. Não gosto de estereótipos, pois esses plantam discórdia na Terra.

    Estive pertinho de seu amado Irã…No Golfo Pérsico ou Árabico.

    Aprecie as fotos no blog,

    com muito carinho,
    Denise.

  4. Unknown

    Obrigado pelo post, o filme é muito bom. Ben Affleck esta impecável no seus filmes. Ele sempre surpreende com os seus papeis, pois se mete de cabeça nas suas atuações e contagia profundamente a todos com as suas emoções. Adoro porque sua atuação não é forçada em absoluto. Suas expressões faciais, movimentos, a maneira como chora, ri, ama, tudo parece puramente genuíno. Seguramente o êxito de A lei da noite filme deve-se a participação dele no filme, porque tem muitos fãs que como eu se sentem atraídos por cada estréia cinematográfica que tem o seu nome exibição.

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