Livros para entender melhor o Irã

Poucas obras da rica e tradicional
literatura iraniana são conhecidas no Ocidente, especialmente a literatura moderna. Geralmente quando encontramos livros e filmes sobre o Irã, a imagem que chega até nós paira sobre o terrorismo, guerras e o regime fundamentalista islâmico. Para tentar modificar essa imagem estereotipada, a escritora e jornalista iraniana radicada na Inglaterra Kamin Mohammadi escreveu o livro The Cypress Tree (2011), onde ressurgem suas memórias familiares do lindo país onde cresceu, “que tem uma história rica que muito influenciou a cultura ocidental, um lugar cheio de diversão e romances, onde os azulejos turquesa cintilavam nas paredes, e onde a brisa tinha cheiro de jasmim e belas romãs vermelho-rubi  eram carinhosamente descascadas pelas tias”. A intenção da escritora é “contrabalançar a importância que os livros normalmente publicados sobre o Irã, dão  às prisões, espancamentos, brutalidade e ignorância – que é apenas uma pequena (embora terrível) parte da realidade do seu país”  e  mostrar uma imagem mais condizente com o cotidiano e com vida moderna do seu povo. A seguir uma lista dos livros considerados pela autora como o melhor da literatura iraniana e também alguns livros, não iranianos que ela considera essenciais para compreender melhor o seu país:

Shahnameh (O Livro dos Reis) por Firdawsi 

Escrito no século X,  é  como se fosse a Ilíada e Odisséia compilada em um só volume. Este poema épico que contém 60.000 versos e narra a mítica – e real – a história do Irã, desde a criação até a conquista muçulmana  no século VII foi escrito durante 30 anos. Como após a invasão, os árabes destruíram grande parte do acervo literário do Irã esta obra foi responsável por manter a língua e a cultura destes distinta da dos árabes. Além de  contos heroicos e batalhas, este livro também contém histórias de amor e tratados filosóficos. É também deste livro que muitos iranianos escolhem o nome de seus bebês.


Persépolis: A História de uma Infância e Persépolis 2: A História de um retorno por Marjane Satrapi

Estas são esplêndidas histórias em quadrinhos (publicadas no Brasil pela Editora Cia. das Letras em 4 volumes), não apenas pela simplicidade de seus desenhos em preto e branco, mas também pela forma que Satrapi consegue contar a história da Revolução no Irã até seu exílio e posterior retorno na visão irreverente da menina rebelde que ela foi. A narrativa visual torna os livros acessíveis até mesmo para aqueles que nunca leram nenhum livro sobre o Irã. A história do Irã, apresentada em seu livro não o mais importante, mas sim o senso de humor e sensibilidade que deram origem também a um belo filme em animação feito pela própria autora.

Lonely Planet Guide to Iran por Andrew Burke

Este livro teve a colaboração de Kamin Mohammadi nos capítulos de “artes” e “cultura” e, considera este o melhor guia de viagens sobre o Irã, principalmente porque o escritor Andrew Burke é um apaixonado por todas as coisas do Irã,  fala persa fluentemente, visita o Irã freqüentemente, e não tem medo de andar por todo o país em  busca de recomendações interessante para os turistas. Desmentindo a percepção de que o Irã é um país remoto e difícil de visitar, este livro dissipa quaisquer noções de hostilidade, além de ser um guia bem prático”.

The Mantle of the Prophet: Religion and Politics in Iran  por Roy Mottahedeh

Publicado pela primeira vez em 1985, o livro de professor de Harvard Mottahedeh é uma leitura obrigatória para qualquer pessoa interessada não apenas em aiatolá Khomeini, as raízes da Revolução e as origens da República Islâmica, mas também para quem aprecia uma história emocionante. Ele define a biografia de Khomeini contra o pano de fundo do pensamento religioso iraniano, de Zoroastro até os modernos pensadores islâmicos, contextualizando a história moderna em um estilo agrádavel de ler.

Persia: Bridge of Turquoise por Seyyed Hossein Nasr

Um belo livro de cabeceira, que foi encomendado em 1970 pelo então imperatriz Farah Pahlavi. Este livro mostra as várias facetas do Irã, desde a riqueza de seu patrimônio, a arquitetura esplêndida, as riquíssimas artes decorativas, as diversas e belíssimas paisagens de tirar o fôlego – partindo da cadeia montanhosa  de Teerã, passando pelo vasto planalto aonde os pastores conduzem seus rebanhos até as superfícies cintilantes de deserto. Este ainda é o livro mais ricamente ilustrado sobre o Irã, mostrando a beleza e diversidade do país.

A Conferência dos Pássaros por Farid ud-Din Attar


(Publicado no Brasil pela Editora Cultrix )

A Conferência dos Pássaros é uma obra-prima do século XII, escrito por Attar, um sufi persa. É um poema de 4.500 versos que se relaciona com o conto de quando todos os pássaros do mundo se reuniram para tentar encontrar um governante justo. É uma das nossas melhores obras alegóricas, descreve a jornada do buscador em direção a Deus, em rimas dísticos que estabelecem a doutrina mística dos sufis. Uma obra   profundamente espiritual que também pode ser apreciado como pura literatura, que ajuda entender a natureza particularmente mística de devoção religiosa iraniana.

A História de Leyla e Majnun por Nizami

(Publicado no Brasil pela Jorge Zahar Editor)

Esta célebre história de amor, em estilo de poema épico data do século XII e é a mais famosa escrita pelo poeta Nizami. Acredita-se ter servido de inspiração desde William Shakespeare (no romance Romeu e Julieta ) a Eric Clapton (na canção “Layla”). Na grande tradição mística  iraniana  é também uma alegoria da busca da alma por Deus.



 Sin: Selected Poems de Forough Farrokhzad

A nossa mais significativa poeta do sexo feminino no Irã, Farrokhzad rompeu convenções e tabus quando começou a publicar no Irã de 1950 seus versos cheios de sensualidade, desejo e saudades. Sua franqueza custou caro pois seu único filho lhe foi tirado e ela passou um tempo em instituições psiquiátricas. No entanto, ela é uma inspiração não apenas por sua poesia. Seu filme de 1963 “The House is Black” , sobre a vida em uma colônia de leprosos, é o precursor do estilo realista de cinema iraniano popularizado por nomes como Abbas Kiorastami  20 anos mais tarde.

The Blind Owl por Sadegh Hedayat

Um clássico da literatura persa moderna, o pequeno romance de Hedayat é alegórico e onírico, seu herói demente e delirante não difere muito de um protagonista de Poe. A literatura persa sempre dependeu da alegoria, mas assim como poetas como Nizami usavam-na como meio para aproximar as pessoas de Deus, os modernos escritores iranianos usam-na para proteger-se da punição do estado. Isto era tão válido quando Hedayat escreveu este livro (1937, sob o Xá Reza) como é ainda hoje.



Todos os Homens do Xá Homens: um golpe de Estado americano e as raízes do terror no Oriente Médio por Stephen Kinzer
(no Brasil publicado pela Editora Bertrand, trad. de Pedro Jorgensen Junior)

Com uma leitura fácil de entender, Kinzer dá conta do golpe da CIA no Irã, em 1953, da derrubada do  primeiro-ministro iraniano Mohammad Mosaddegh que nacionalizou a indústria do petróleo  até o retorno do Xá ao poder  pela mão dos Estados Unidos e o papel extremamente importante da Grã-Bretanha na história moderna do Irã desconhecido para muitos ocidentais. Dado que este episódio contém as raízes da corrupção do regime do Xá, da colonização do Irã pelos Estados Unidos  e, finalmente, as raízes da própria revolução, é uma leitura essencial.

 O Xá dos Xás por Ryszard Kapuscinski

(publicado no Brasil pela Cia. das Letras) 

O lendário polonês Kapuscinski foi correspondente no Irã durante a Revolução e sua cobertura dos acontecimentos daqueles dias é emocionante e esclarecedora. Seu estilo é eminentemente legível, ele tem uma compreensão enorme e a capacidade de contar uma história angustiante da forma mais graciosa, preservando simultaneamente um delicioso senso de humor absurdo e fantástico. Ele é incomum por não demonstrar um ponto de vista orientalista e por isso é capaz de comentar sobre os acontecimentos do cotidiano e do sistema iraniano com objetividade sem o senso de superioridade implícito que os escritores ocidentais tendem  quando escrevem sobre o Irã.

 Daiey Jan Napoleão (Meu Tio Napoleão) por Iraj Pezeshkzad

Publicado pela primeira vez em 1973 em Teerã, este romance controverso virou mania nacional quando foi transformado em uma série de televisão seis anos mais tarde. Situado entre a ocupação aliada do Irã durante a Segunda Guerra Mundial, concentra-se sobre as travessuras de uma família que vive à moda antiga, governada por um patriarca paranóico, o tio. Vivo e divertido, o romance, muitas vezes joga com a tendência iraniana de imaginar que os britânicos estão por trás de tudo o que acontece no Irã. Tornou-se um ponto de referência cultural no Irã pré-revolucionário e tanto o livro quanto a série de TV são tão icônicos que as tentativas pós-revolucionárias para proibi-lo não tiveram sucesso em removê-lo da mentalidade do povo.

 Gardens of Persia por Penelope Hobhouse e Harpur Jerry

Um desses livros maravilhosos que surpreende, informa e agrada em igual medida. Os jardins são muito importantes para os iranianos – a antiga palavra persa para “jardim” é “paradaiza” (literalmente, algo cercado por um muro) que deu origem a palavra paraíso. Isso deve dar pelo menos uma pista para a importância dos jardins na cultura persa, e neste livro, Hobhouse revela a história e o esplendor dos magníficos jardins persas desde aquele criado por Ciro, o Grande em Pasárgada há mais de 2.500 anos atrás, passando pelos jardins paradisíacos do século XIX até os modernos projetos islâmicos do século 21. Ao longo do caminho, ela desvenda a grande influência jardins persas tiveram no projeto do jardim ocidental quase sempre não reconhecida  e também os relaciona história e religião do povo iraniano. 

 New Food of Life: Ancient Persian and Modern Iranian Cooking and Ceremonies por Najmeh Batmanglij

Na cultura iraniana, os rituais e celebrações acontecem em torno da comida, o Sofreh (refeição tradicional servida sobre uma toalha no chão), e as estações do ano. A cozinha persa além de ser uma das mais antigas do mundo (receitas podem ser encontrada em tabletes cuneiformes de 4.000 anos), é também uma das mais saudáveis e deliciosas. Este livro magistral traz receitas antigas fáceis de aprender, e também relata histórias dessa cultura, com aulas de história, explicação de rituais, e até mesmo o humor de Nasruddin Mullah. Maravilhosamente ilustrado, este livro é a cozinha persa para todos.


Adaptado do artigo de Kamin Mohammadi para o site 
Tehran Bureau|FRONTLINE|PBS

Este post tem 0 comentários

  1. Janaina Elias

    Olá Cassio, muito obrigada por sua contribuição. Ainda não li este livro.
    Abraço.

  2. Unknown

    Todos os homens do xá é indispensável para entender o Irã moderno… É a atual base do meu projeto de mestrado sobre o Irã. indispensável.

  3. Bluuu

    Persepolis, Layla e Majnum e A Conferência dos Pássaros são livros da minha lista de favoritos! Gostei muito das demais dicas! Estou procurando o Diwan de Hafez e O Jardim das Rosas de Saadi de Shiraz.

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