Viagem ao Irã: Feriado em Shiraz, o que fazer?

Darvazeh Qoran (“Porta do Alcorão”), Shiraz

Salam amigos, conforme prometi, hoje vou narrar como foi o feriado imprevisto que me fez esticar minha estadia em Shiraz.
📆 Shiraz, 02/09/2013: 
Às 10hs encontrei Hamed e Rahim na recepção do hotel. Hamed que estava de folga dirigia. Tive a grata surpresa de saber que ele se esforçava para falar em inglês, enquanto Rahim bancava o DJ com um aparelho de som no banco de trás, mas dessa vez ele não trouxe só Ebi no repertório. Eu estava toda feliz que ia ver o túmulo de Hafez e o Bagh-e Eram, quando descubro o quê? Hoje é feriado no Irã! E pra piorar, tudo está fechado! Aposto que nem os rapazes sabiam que os parques fechavam, obviamente eles não tinham o costume de guiar tantos turistas. Eu mesma tinha visto antes da viagem que havia no calendário uma data chamada: Martírio de Jafar Sadeq, mas ninguém me avisou que era feriado!
Quando estacionamos em frente ao túmulo de Hafez, fiquei com cara de tacho e apontei no mapa o Saadi. Deduzi: se eu for embora de Shiraz sem ver um poeta, pelo menos vejo outro! Mas para aumentar minha frustração, Saadi também estava fechado! E agora, minha passagem para Yazd estava marcada para 18hs, e eu ainda não tinha visto quase nada de Shiraz…
Rahim e Hamed que eram muito cavalheiros, vendo a minha cara de inconformada fizeram o esforço de procurar algum lugar que estivesse aberto para me entreter. Foi então que tive a grata surpresa de conhecer o Darvaze Qoran (Porta do Alcorão), antiga porta da cidade localizada no centro sul de Shiraz. Esse nome é devido à salinha localizada no alto do portão, onde se encontra um antigo exemplar do Alcorão. É costume no Irã que os viajantes passem por baixo do livro sagrado  para realizar uma viagem segura. O local também abriga um belíssimo jardim, onde se situa a casa do poeta Khaju Kermani. Em uma lojinha subterrânea, um senhor calígrafo escreveu meu nome com uma poesia em um chaveirinho de madeira envernizado por 5000 tomans. 
Passei pela Porta do Alcorão, por isso minha viagem foi  tranquila…
Seguindo Rahim e Hamed, os “homens de preto”…

Casa do poeta Khaju Kermani

Que beleza de caligrafias persas!

Poema de Khaju Kermani

Muito prazer, Khaju Kermani!

Como o calor era monumental, os meninos me convidaram para tomar um refresco de talebi, depois caminhamos em uma rua perto do santuário de Shah Cheragh. Provei uma samosa indiana, e um tipo de refresco chamado khakshir, que é feito com umas sementinhas minúsculas chamadas teff.  O mais curioso é que você bebe as sementinhas inteiras e nem sente. Rahim, ainda me ofereceu uns doces cremosos, mas aquela ideia de comer andando não me agradou muito. Entramos em um shopping center, que ao meu ver só tinha de diferente dos nossos os modelos das roupas e as placas em persa. Eu pensei em olhar os manteaus, cujo preço era algo em torno de 10 a 20 dólares. Mas nenhum me agradou muito, achei ocidentalizados demais. Tomei o maior susto ao ver aquelas leggings listradas bi colores que me doem na vista também por lá!
Finalmente chegamos ao santuário de Shah Cheragh (“Senhor da Luz”), onde estão os túmulos de Ahmad e Mohammad, irmãos do Imam Reza. Como de praxe, na entrada há uma tenda onde uma gentil funcionária me empresta um chador e revista minha bolsa. Ela adverte que não posso entrar com minha câmera, então me dá um cartãozinho para deixá-la no guarda-volumes.  Tirar fotos com celular estava liberado, mas para minha tristeza, meu cartão de memória estava cheio (sorry, imagens do Google neste post de novo)! 
Este santuário também era maravilhoso, embora eu não tenha visto um sentimento de devoção tão grande como o do Imam Reza. Vi homens fumando e algumas mulheres deixando o cabelo aparecer sem nenhuma preocupação.  Enquanto eu com minha pouca prática, quase me estrangulava com meu próprio chador, o próprio Hamed gentilmente se prontificou a ajeitá-lo sobre mim de forma que eu ficasse mais confortável.O cavalheirismo dos rapazes iranianos me surpreendia toda hora!
Para entrar no santuário é necessário guardar os sapatos e como de costume há uma entrada separada para homens e mulheres. Eu entrei, enquanto os meninos me esperavam do lado de fora. Ali dentro sim, é muito similar ao Imam Reza, embora menos lotado. O  teto também é decorado por espelhinhos reluzentes e há muita gente emocionada, chorando e batendo no peito. Eu fiquei parada ali só observando, mas ninguém pareceu notar que eu era khareji.
Rua do Santuário Shah Cheragh (Foto: Flickr: reibai)

Pátio do Shah Cheragh (Foto: Flickr: reibai)

Interior do santuário (Foto: Geographica)

Ao sair do santuário devolvi o chador e a funcionária perguntou: “Você gostou?”. Eu respondi: “Sim, maravilhoso!” Depois peguei minha câmera no guarda-volumes e Hamed pediu para eu conferir. Mesmo em um país tão seguro como o Irã, não dá pra vacilar! Uma das coisas que ainda me inquietavam é não ter visto os tais basijs, a polícia da moral  em lugar nenhum, talvez eles não fiquem em lugares onde há muitos turistas. Hamed era um policial, mas não consegui imaginar naquele rapaz tão simples e gentil nenhum traço de alguém que está a serviço de um  sistema repressor tão odiado pelo ocidente.
Como não havia muita coisa para fazer, andei pensando em trocar minha passagem para a tarde do dia seguinte embora eu fosse apertar ainda mais meu cronograma, não me conformava em sair do Irã sem ver os túmulos dos poetas.
Á tarde fui novamente convidada para almoçar no apartamento de Bahar. Ela me pediu desculpas, por que o almoço era o mesmo de ontem, mas para mim isso não importava nem de longe. Enquanto os amigos iranianos comiam o kebab de frango usando as  mãos sem cerimônias, eu segurava com a ponta dos dedos timidamente, mas aos poucos fui pegando o jeito deles. Só não consegui imitar aquela mania de lamber os dedos, ao em vez de usar o guardanapo! Como manda a hospitalidade iraniana eles jogavam mais pedaços de carne no meu prato, mas eu estava começando a sentir meu estomago doer. 
Depois do almoço percebi um terrível, equívoco, Rahim havia trocado minha passagem não para as 14hs, mas para ás 23hs do dia seguinte. Enquanto os amigos se divertiam fumando geliun (narguile) deitados no tapete, chegou uma outra amiga deles chamada Alma, a quem Hamed chamava carinhosamente de topoli (gordinha), mas como eu não estava de bom humor, acho que ela não deve ter ido muito com minha cara. Fui até a varanda e não sei como explicar, mas comecei a me sentir ainda mais entre estranhos, a dor no estômago aumentou e eu comecei a chorar de nervoso. Bahar me viu chorando, veio até mim me chamando de honey Janet, e eu mostrei pra ela o bilhete errado. Ela me ofereceu um chá para me acalmar e me deu uma pulseira cor de rosa mega extravagante que aceitei com certa relutância…
Por fim, Hamed me levou até o terminal, parecendo embaraçado com a situação. Ele me explicou que Rahim não havia encontrado ônibus para o horário que eu queria por isso ele pegou para as 23hs. Andamos de guichê em guichê, até que encontramos na mesma companhia Hamsafar um ônibus que saía no horário certo, porém eu teria que pagar um trocado a mais. Porém isso não importava, eu iria no melhor ônibus para Yazd… Hamed ao ver minha cara de alívio por ter resolvido o equivoco disse: “Nunca chore no Irã, ok?” Sei que no final do dia, pedi muitas desculpas e acabei recusando o convite de sair à noite com eles para me despedir. Preferi voltar para o hotel, descansar e na manhã seguinte dar uma corrida nos lugares históricos que desse tempo. De qualquer forma, tenho muito o que agradecer por tudo que esses meninos de Shiraz fizeram por mim.
Enquanto na casa dos meus amigos me dão tanta comida que chega a não caber, aqui no hotel vou sobrevivendo à base de biscoitos, suco, água e chicletes. Mas em compensação, sinto que um pouco de privacidade ajuda a colocar meus pensamentos no lugar e passo o tempo cuidando de mim mesma enquanto assisto canais da TV iraniana.  Meu amigo Ehsan ligou de Yazd, perguntando a que horas eu chegaria. A voz dele era tranquila. Seu inglês era perfeito e ele  misturava algumas palavras em português, o que me fazia pensar que eu teria a melhor companhia no meu próximo destino.
O próximo post será uma maratona de lugares históricos em Shiraz e minha chegada em Yazd. Até a próxima!

Este post tem 0 comentários

  1. Anônimo

    Salam, Jana Jan!

    o chá de lima da Pérsia tem sempre um sabor de aventura, cultura e é feito pela mais linda das criaturas: você!

    Bause Kbir!

  2. Janaina Elias

    Salam Denise jan, linda é você poetisa do Khaleej! Obrigada pelo seu grande carinho e por sempre estar presente aqui no nosso chá! Nunca vou me esquecer de toda essa aventura e espero ter mais outras como essas quem sabe de novo no Irã ou em outras terras do Oriente!
    Booooos!

  3. Anônimo

    Janaina,
    Adorei a presente postagem e a anterior. Acredito que tudo na vida tem uma razão. Assim, não importa que alguns lugares que vc programou visitar estavam fechados. Vc conheceu outros lugares, também encantadores. E, também, é mais uma razão para voltar a Shiraz novamente!
    Abraço,
    Ana.

  4. Janaina Elias

    É verdade Ana! Apesar de eu ter me sentido triste no momento, as lembranças boas prevalecem sempre. Com certeza voltarei a Shiraz, outros tesouros ainda me esperam!
    Abraços!

Deixe um comentário